Em menos de 50 dias de governo, Jair Bolsonaro dilapidou parte relevante do seu capital político junto ao establishment. Nomeou um ministério que (com as exceções de Paulo Guedes, Sergio Moro e militares) é formado por jihadistas e permitiu aos filhos um protagonismo sem sentido. “O presidente da República é formalmente Jair Bolsonaro, mas parece que não é ele quem exerce o poder de fato, e sim seus filhos”, escreveu o editorial do Estadão sob o título “filhocracia”.
Os piores episódios de JB como candidato e presidente envolvem os filhos. Na campanha, Eduardo disse que “O pessoal até brinca que para fechar o STF você não manda nem um jipe, manda um soldado e um cabo. Se você prender um ministro do STF, você acha que vai ter uma manifestação popular?”. Pretenso especialista em diplomacia, Eduardo se colocou como um ministro informal de relações exteriores.
Na virada do ano, foi divulgado que o principal assessor do senador Flavio Bolsonaro havia movimentado R$ 7 milhões em três anos e, segundo as evidências, retomava parte dos salários dos servidores do gabinete. O caso Queiroz rachou a imagem anticorrupção de Bolsonaro. Mais aguerrido entre os irmãos, o vereador Carlos Bolsonaro é o responsável pela estratégia digital do pai. Análise de O Globo em 500 tuítes feitos por Carlos entre 15 de dezembro e 15 de fevereiro constatou que 72,2% das postagens feitas são ataques. O alvo preferencial é a imprensa, mas o ponto alto foi chamar o ainda ministro Gustavo Bebianno de “mentiroso”.
Falta controle
Em todos os episódios, o presidente ficou ao lado dos filhos. Sobre Eduardo, disse ter “advertido o garoto”. Sobre Flávio, que “estão perseguindo o garoto para me atingir”. Sobre Carlos, o presidente afirmou via Twitter e entrevista à TV Record que o então ministro Bebianno “mentiu” ao dizer que falara com ele sobre as denúncias de fraudes nas contas da campanha do PSL.
A noção de que JB não tem controle sobre os filhos (ou pior, os incentiva em suas intrigas) reforça a impressão no establishment de despreparo para o cargo. Se JB conseguir aprovar a reforma da previdência é possível que essa impressão seja vista no futuro como uma curva de aprendizado. Mas se as promessas de boom econômico não se concretizarem, JB terá um governo sob ameaça constante. Eleito com a intenção de ser um novo Médici, JB hoje se encaminha no melhor dos casos para ser um Itamar Franco (trôpego e com um plano econômico eficaz). No pior, vira um Jânio Quadros, um populista de discurso moralista sem capacidade de governar.
Foto: Roberto Jayme/Ascom/TSE