De um antigo arquivo sobre como um ministro deve se preparar para sessões no Congresso:
1. As sessões com ministros na Câmara e no Senado não acontecem para que um convença o outro de qualquer tema. Isso se faz em reuniões privadas. As sessões são um espetáculo. Quanto maior a audiência, maior é a disputa por histrionismo. São históricas e hilariantes as contas dos parlamentares que alongam seus discursos apenas para entrar falando no ao vivo do JN. A exibição da sessão pela Globonews tem um efeito menor, mas ainda assim potente na adrenalina parlamentar.
2. O ministro está se dirigindo a um outro Poder da República e deve se portar se não estivesse na sua casa. Os deputados e senadores devem sempre ser tratados como “vossa excelência”.
3. Isso significa que as perguntas não são feitas para serem respondidas, mas para serem posteriormente exibidas nas redes sociais como prova da “coragem” do parlamentar. As ofensas e provocações fazem parte do show.
4. Nada é pessoal, portanto. O convidado está apenas assistindo a um show no qual ele é coadjuvante e precisa manter-se assim. A função do convidado nessas sessões é de repetir as mesmas coisas tantas vezes e com a voz tão monótona até que em algum momento a sessão se esvazie. Ministros como Pedro Malan, Henrique Meirelles, Marcílio Marques Moreira e Rubens Ricupero abusavam da voz monocórdica. Nenhum deles jamais deu lide numa Comissão do Congresso.
5. São expressamente proibidos a ironia, o cinismo, a chacota e o tom professoral. Quem vai ao Congresso precisa de voto. Não se ganha voto com arrogância.
6. Quando um parlamentar lhe perguntar, preste atenção. Não mexa no celular, não converse com assessores ou com as pessoas da mesa. Anote o nome do autor de cada questão e inicie a resposta citando “agradeço ao deputado X por me dar a oportunidade de esclarecer esse assunto….”
7. Assim como os parlamentares, o ministro tem a oportunidade de usar a sessão para dar o seu recado para a Dona Maria. Para isso, deve levar consigo quatro ou cinco pontos-chave, frases de fácil assimilação que resumem o seu pensamento. A ameaça do apocalipse em caso do que o ministro defende não ocorrer é uma delas, mas nunca a única. Deve haver pontos de esperança (“se tal lei for aprovada, vai acontecer isso e aquilo…”), de correção (“tal projeto corrige essa e aquela injustiça”), de apaziguamento (“a lei não vai afetar a Dona Maria”) e de compartilhamento (“ao aprovar essa lei, vocês serão os responsáveis por X ou Y. Não eu. Eu sou apenas um técnico, mas os senhores como representantes do povo…”).
8. Um ministro da Fazenda/Economia precisa mostrar todo dia que acordou preocupado: Como podemos gerar mais empregos/reduzir inflação/aumentar o crescimento/sair da recessão? Como podemos criar as condições para as empresas investirem mais, faturarem mais e lucrarem mais? Como podemos preparar o Brasil para a concorrência de outros grandes polos de inovação e tecnologia, aqui nos EUA, na China, na Índia? Como preparar os jovens para esse mercado global? Toda a ação do ministro deve ter, em seu final, a função de gerar desenvolvimento econômico, o que significa mais riqueza e bem-estar para os brasileiros.
9. Os pontos-chave, portanto, devem fazer parte de uma relação causal. “A lei X vai permitir que tal região cresça, que se desenvolva da forma Y e seus jovens tenham W oportunidades”.
10. Nunca pode passar satisfação porque gerir a economia brasileira é como ser o chefe de um pronto-socorro na beira da estrada. Você sempre vai ter seus leitos lotados de acidentados, nunca de pessoas saudáveis. A preocupação e o otimismo comedido devem fazer parte da persona do ministro.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil